quarta-feira, setembro 24, 2003


É sempre difícil comentar a obra dum artista no início da carreira. Geralmente o jovem pintor anda à procura da sua via e de maneira muito versátil experimenta diversos caminhos sem aprofundar nenhuma deles, até encontrar o tipo de expressão onde se sente bem, mas as vezes leva longos anos.
Em paralelo trabalha as técnicas que melhoram com a experiência mas no seu percurso cria obras muitas vezes com alguns desequilíbrios por falta da integração harmonia delas (alias nunca ouvi falar dum escritor que realizou a primeira vez uma obra prima: porque seria diferente com um artista, o pincel substitui a caneta).

No caso do Henrique Tigo fiquei logo muito admirado, bem sei que tem pai Pintor (Bom) e que deve ajudar (mas o talento não é hereditário). Desde o início o Henrique Tigo teve uma personalidade muito independente.
Para já demonstrou uma vitalidade fora do comum: é só ver o curriculum vitae do homem em 10 anos ( dá para duvidar que o dia só tenha 24 horas).
Depois logo no primeiro quadro que fez (Homenagem a Catarina de 1992) já arranjou uma técnica própria afastada dos Mestres.
Já andava no próprio caminho: formas simplificadas que sugerem mais que definem cores básicas fortes que transmitem uma grande luminosidade aos trabalhos. O movimento é sempre presente através dos contornos seguros e puros sublinhando as formas e figuras, o que sempre anima o espectador e tira qualquer lassidão na visão das obras.

Com os anos pode-se ver a técnica progredir mas a simbologia do início continua igual. Afinal trata-se duma pintura alegre que transmite muito bem a boa disposição geral do artista (não é de deprezar em períodos de crise onde as pessoas estão tristonhas).
Aposto que daqui a uns anos, se continuar neste caminho, o Henrique Tigo deverá tornar-se um pintor bastante procurado.
Com a sua vitalidade não duvido que irão aparecer oportunidades favoráveis que ele próprio irá criar se não aparecer em naturalmente.

J.P. Blanchon

quarta-feira, setembro 17, 2003

Arte Postal

Todos os dias me perguntam:

Mas afinal o que é arte postal?



Quando Van Gogh enviava, em 1884, suas cartas desenhadas para seu irmão Theo, iniciava já naquela época o que se tornou num movimento artístico de grande importância mundial por ser um meio de comunicação entre os povos e raças...
A 16 de fevereiro de 1916 Marcel Duchamp envia aos seus vizinhos, o casal Arensberg, um cartão-postal que era uma montagem com pedaços de quatro outros cartões. Está criada uma nova forma de expressão artística: a mail art, que tem desdobramentos recentes na rubber art (arte carimbo) e stamp art (arte selo).

Na mail art, através de desenhos, colagens, pinturas, fotografias, e sem a preocupação de concurso, selecção ou currículo, sente-se apenas o delicioso sabor da comunicação através da Arte. Esses encontros foram iniciados em 1962, quando Ray Johnson criou a New York Correspondence School of Art, possibilitando uma maior aproximação intelectual e sem fins lucrativos.Esse é o objectivo da Arte Postal: tocar as pessoas para esse grande encontro interno, pois no momento de criação redescobrimo-nos a cada instante.
Os integrantes do Grupo Fluxus são os primeiros a fazer uso sistemático do cartão-postal com intenções artísticas. Nos anos 1970, o Colectivo de Arte Sociológica passa a usar o correio como canal artístico e realiza em 1975, no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, uma exposição internacional de arte carimbo. A arte postal serviu para aumentar a circulação das obras de
arte em todo o mundo, permitindo aos artistas que viviam em pequenas cidades, inclusive nos países socialistas, participassem de mostras nacionais e internacionais, além de reunir criadores de várias áreas, acabando com a compartimentação artística. Já em 1973 Christian Rigal realizara o 1º Festival Internacional do Arte Postal de Vanguarda, somando oitenta exposições diferentes realizadas simultaneamente na França, Alemanha, Itália, Estados Unidos e Japão, envolvendo cerca de 1. 500 obras de 300 artistas.
A Arte Postal (Mail Art Call) neste momento, tem três palavras que servem de chave: distribuição, criatividade, pluralidade. O circuito é interminável, tanto quantas as caixas postais, no mínimo. Nada a ver, portanto, com o espaço bi-unívoco da galeria de arte. Desde que exista um selo e um tema basta para se fazer uma exposição de arte.
Cada objecto de Arte Postal transposto para o espaço fechado de uma galeria tende a morrer em algum dos seus pontos: deixa de reproduzir, apenas se mostra. Na verdade, e à maneira de um electrão numa câmara de nevoeiro, o que está em causa na Arte Postal é o desenvolvimento de uma geografia, um espaço que se multiplique em linhas de força: fluxos e mais fluxos. É que a
Arte Postal faz-se sobretudo em trânsito, de dentro para fora e de fora para dentro. Ao menos põe em evidência todo o sistema pela sua negativa. Fazer uma exposição de Arte Postal é deter a máquina, porque avalia aquilo e o outro que esta possui de essencial, e isso como forma de lhe evidenciar os mecanismos.
Expor Arte Postal no sentido em que se expõe quadros ou esculturas é inviabilizar um ponto fixo do espaço e no tempo a sua reprodução, facto momentâneo mas básico, de modo a que tudo permaneça na mesma, isto é, a avaria constitui a condição
necessária ao funcionamento de todo o mecanismo. Na Arte postal, somente, emissores em primeiro e segundo grau se encontram implicados. Quem recebe também emite, utilizando a mesma via - o correio, e segundo as modalidades de uma mesma
forma - a arte. Um nome e uma morada são elementos ínfimos, moléculas, que se organizam caoticamente numa rede sempre alargada.