quinta-feira, abril 24, 2008

José de Matos Cruz

Morreu o “Ti-Padrinho” José Matos Cruz



Na passada sexta-feira, dia 18 de Abril de 2008, enquanto lia o Jornal “O Varzeense”, que tinha acabado de chegar, recebi a triste notícia pela voz do meu “Tio” José Carneiro (outro tio emprestado) que o José Matos Cruz morreu, costuma-se dizer que não há coincidências, mas foi a ler o Jornal que Matos Cruz ajudou a criar e a crescer que recebi a má nova, o “Ti-Padrinho” tinha nos deixado.
José Matos Cruz, não era nem meu Tio nem meu Padrinho, mas toda a minha vida lhe chamei “Ti-Padrinho”, pela amizade e carinho que nutria por ele.
Matos Cruz casou na mesma igreja em Lisboa, no mesmo dia, no mesmo ano e quase a mesma hora que os meus avós maternos e também fizeram as botas de ouro no mesmo dia, na mesma igreja novamente todos juntos.
Ele deu a notícia do casamento dos meus pais, a notícia do meu nascimento da minha primeira exposição e publicou o meu primeiro artigo de opinião no Varzeense, foi ele igualmente que me apresentou na Comarca de Arganil e no Jornal de Arganil.
Era rara a minha exposição ou do meu Pai em que o Matos Cruz não tivesse estado, no Natal e nos aniversários, ele nunca se esquecia de ligar, assim como nos momentos felizes e nos tristes eu lembro-me deste grande homem estar sempre presente.
Quando entrei para a Faculdade e resolvi fazer uma “Análise Demográfica de Góis”, bati a várias portas a pedir documentos e dados, principalmente a porta da Câmara Municipal de Góis e claro que se fecharam todas (o que também já é normal) mas o Matos Cruz ajudou-me e facultou-me muitos dados e documentos, que tinha vindo a acumular aos longos dos anos. Acredito mesmo que os seus arquivos serão os melhores, nem a Câmara terá tantos documentos e tantas informações sobre o concelho como tinha no seu arquivo, além de objectos históricos que davam para fazer um museu, além de obras de arte. Da minha autoria tinha algumas, inclusive, tinha desenhos meus de quando tinha 6 anos e até um quadro sobre o D. Luiz da Silveira que apresentei num GóisArte e que depois lhe ofereci, e que ele tinha orgulhosamente colocado no cimo de uma espadas em sua casa.
Sei, também, que não fui o único a quem ele ajudou a realizar trabalhos, teses, etc. sobre o nosso concelho, ajudou muito mais gente, ajudou todos aqueles que amavam a sua terra como ele.
Quando acabei a Faculdade melhorei essa análise e a ADIBER publicou essa obra e, claro, nos agradecimentos tenho um parágrafo dedicado e este grande regionalista que muito contribuiu para ela.
José Matos Cruz não conseguia estar parado e em 2003 criou a Mostra de Artes Plásticas de Vila Nova do Ceira, convidou-me assim como convidou o meu Pai e outras pessoas, para fazermos parte da organização, Mostra essa, que se tornou no maior evento de artes plásticas que Vila Nova do Ceira viu.
Matos Cruz, vinculado ao amor que nutria pela sua terra, foi sempre um homem próximo do povo e que tratava com estima e consideração todos os seus conterrâneos. Além de muitas saudades, deixa-nos uma grande lição de regionalismo e vários anos de trabalho em prol do progresso e desenvolvimento desta terra. Lutou igualmente pelo saber e pela cultura no nosso Concelho, quer como vereador da cultura da CMG ou ainda como criador de algumas actividades culturais, que iram ficar para a história de Vila Nova do Ceira e até de Góis.
Durante anos esteve a frente do jornal “O Varzeense”, que não existia se não fosse o impregno deste “vinte e quatro horas por dia”.
Mesmo que houvesse alguém que não simpatizasse com ele é impossível não reconhecer o seu legado e como ele tocou directamente ou indirectamente a vida de todos os Varzeenses e daqueles que visitavam esta nossa terra.
É caso para se dizer que Vila Nova do Ceira está mais pobre e a sua “desertificação” aumentou, a nossa terra está verdadeiramente de luto, desapareceu mais um dos seus maiores regionalistas e vultos…
Obrigado “Ti-Padrinho” por tudo o que fizeste por nós, teus amigos e conterrâneos.

Henrique Tigo

sexta-feira, abril 11, 2008

34 anos depois do 25 de Abril

34 Anos de Abril.

Continuando a cumprir um tradição pessoal de dar a conhecer a opinião de um jovem que nasceu no pós-Abril, depois de ter escrito dezenas de textos, artigos e até uma peça de teatro sobre o 25 de Abril de 1974, hoje que faz 34 anos após o dito Abril, trago até vós um texto introspectivo.
Toda a minha vida vivi no meio de democratas, claro que uns mais que outros, mas também vivi com pessoas ligadas ao antigo regime, e não têm as melhores impressões uns dos outros…
Mas o que é um democrata? Segundo o Dicionário de Língua Portuguesa do texto editores – Tomo I de 2006 – Democrata é uma pessoa partidária da democracia ou que promove a democracia como um principio fundamental ao sistema politico ou ainda no 2. gén. Popular; Pessoa tolerante.
Mas a verdade é que passados 34 anos de Abril, voltamos a ver nas paragens dos autocarros postares gigantes do Prof. Oliveira Salazar, existem muitos mais livros hoje a enaltecer o estadista do que na sua época, ao comprarmos o Jornal oferecem-nos um livro sobre ele. Até foi eleito o Maior Português de sempre.
Quando falo com pessoas da minha geração, ninguém sabe do que estou a falar, ninguém sabe o que foi o estado novo, nem o Salazar.
Há uns dias fui convidado, por uma pessoa que viveu em prisões politicas e até num campo de concentração, pelas sua ideias politicas, para ser membro do “Movimento Não Apaguem a Memoria” e tendo eu esta paixão pela história, aceitei sem pensar duas vezes. Dias depois, estava a falar com outra antiga “vítima do fascismo” em Portugal e contei sobre o dito esse convite e, qual não é o meu espanto, quando ela me diz que achava mal, pois esse movimento deveria ser só para quem viveu nessa época. Pensei “que coisa, se não querem os jovem, para que querem o movimento? Os jovens da minha idade e mais novos pouco sabem sobre este assunto e se não os querem, como é que não se vai apagar a memória?”
Não temos um museu das vítimas do “fascismo” em Portugal, a António Maria Cardoso, foi transformada num condomínio de luxo, a escola prática de Sete Rios, foi destruída, e a única coisa que temos em Lisboa é a Biblioteca Museu da República e da Resistência, que até tem dois espaços um perto do Hospital Santa Maria e outro no Espaço Grandella, que muito pouca informação têm sobre o estado novo e muito menos sobre os “lutadores anti-fascistas”, e estão quase sempre as “moscas”, claro que não esquecemos a Fundação Mário Soares mas essa é “privada” ou semi, contudo estão a pensar em fazer um museu ao Prof. Oliveira Salazar, não digo que seja mal feito, acho só que devia haver também um museu para quem lutou pela democracia.
Por tudo aquilo que estudei no estado novo, o governo mentia e omitia ao povo, existe até uma frase famosa do Prof. Marcelo Caetano no seu programa televisivo “ Conversas em Família” “Aquilo que verdadeiramente interessa ao povo, não deixa de lhe ser dito” hoje e 34 anos passados o governo vem nos dizer que não existem Licenciados no desemprego, eu pessoalmente conheço milhares (não será isto mentir ao Povo). No estado novo, para só podíamos usar isqueiro debaixo de telha ou tínhamos uma licença ou éramos multados, hoje não podemos fumar debaixo de telha, senão somos multados.
Nos anos 60 morrem dezenas ou milhares de pessoas numas inundações em Odivelas, Santarém etc. não sabemos ao certo o número de vítima porque o estado nunca as assumiu, mas o estado novo pouco ou nada fez por essa vítimas, curiosamente quarenta anos depois dessas cheias, voltamos a ter cheias, não morrem tantas pessoas, mas a verdade é que o estado actual também nada fez pelas vítimas, mas houve um grande peditório para vítimas de inundações em Africa, esquecendo mais uma vez mas nossa vítimas internas.
Findo o estado novo, foram abolidas as gravatas, os fatos, as pessoas usavam cabelos compridos e barbas, hoje para irmos a uma entrevista de emprego, temos novamente de irmos de fato e gravata, usar cabelo “curtinho” e a sem barba.
34 Anos, depois voltamos a ser tratados conforme os nossos títulos e as nossas qualificações e mais uma vez o nosso actual estado cada vez fala mais em qualificações, especializações e formações, mas contudo somos o 3º país da Europa com mais qualificados no desemprego, no estado novo, os qualificados desde que fossem do regime tinham emprego.
Após Abril, voltamos a ver ministros do estado novo a serem ministros novamente.
Outra faceta do estado novo era a censura, censura essa que aos poucos tem vindo a voltar, claro que de uma maneira mais democrata e camuflada, mas que existe, existe…
Finalmente, temos a PIDE, dizia-se que existia pelo menos um PIDE em cada família Portuguesa, eu pessoalmente acho isso, um exagero, (em 1974 exista um total de funcionários da PIDE/DGS, no continente, ilhas e colónias era de 2626, enquanto em 1972, havia 3472), pois não podemos confundir um PIDE com um “bufo” (acredita-se que existiam em 1974, 5247 “bufos” da PIDE, uns com ordenados e outros gratuitos) e “bufos” é o que hoje temos mais...
A PIDE correspondia, afinal a uma certa força “oculta” mas sempre presente no regime de Salazar, representava o que de pior existia com o regime, pois ela informava, dissuadia, prevenia, vigiava, reprimia, destruía e representava uma sociedade que durante quase quatro décadas, a aceitou, a utilizou e encorajo-a, mas que acabou por enfrenta-la e destruí-la, claro que podemos destruir as instituições mas não podemos destruir as pessoas e o pensamento, e muitos PIDES que mataram, torturavam, etc foram reutilizados, perdoados e agraciados (claro que também, devia haver boas pessoas na PIDE, mas desses não reja a história…)
O último Director da PIDE/DGS Major Fernando Silva País, antes de ser director da mesma, tinha chefiado o serviço de fiscalização da Intendência-Geral de Abastecimento, ou seja a ASAE da altura.
Hoje com trinta anos a minha visão de Abril é muito diferente de quando tinha quinze anos, pois quanto mais, “estudo” o estado novo e o 25 de Abril, mais confuso fico…
Já nada me consegue responder à curiosidade de quem não viveu aquela época e são me dados a conhecer alguns aspectos tão variados, tão surpreendentes, que cada vez estou mais confuso.
Quando tinha quinze anos, vivia o 25 de Abril, cheio de esperança e sonhos, com um cravo na lapela, acordava no dia 25 e metia a Grândola aos berros para acordar todos, relembrado que Abril tinha chegado, olhava para livros antigos e aqueles homens eram os meus heróis (aos poucos e poucos, fui conhecendo pessoalmente alguns desse meus heróis e mudei de opinião em relação a alguns…), mas com o passar dos anos o 25 de Abril foi perdendo a “força” os valores do 25 e 26 de Abril foram esquecidos, não só para mim, mas para a sociedade em geral …
As taxas de juro não param de aumentar, assim como a gasolina, pão e o leite e mesmo que o governo negue todos os dia cresce o desemprego o descontentamento aumenta e as pessoas estão cada vez mais cinzentas, Portugueses cinzentos que se deslocam sem sentido, mas assim tudo está normal em Portugal, talvez tenhamos ter retrocedido 34 anos, ou também nunca tenhamos querido mudar…
Só fico com a tristeza de que aquele sonho bom que Abril trouxe se tenha apagado, tenho igualmente tristeza por todos aqueles que perderam anos atrás das grades ou até morreram para termos a dita democracia, e tenham de ver a democracia em que vivemos…
Mas para o ano teremos outro Abril, e para mim a esperança é a última a morrer além que ainda guardo um cravo para mim…

Henrique Tigo