quinta-feira, junho 16, 2005

A Reforma Agrária


Nesta ultima semana e com o desaparecimento físico de dois grandes vultos da politica nacional, General Vasco Gonçalves e Álvaro Cunhal, voltou-se a falar-se de assuntos e temas que estava guardados há alguns anos e que para as gerações mais novas não tem qualquer sentido.
Entre algumas delas estavam o PREC, a revolução de Abril e a Reforma Agrária.
Nesse sentido resolvi fazer este pequeno artigo onde tento de uma forma muito sussinta descrever o que é e foi a reforma agrária em Portugal.

O que é a Reforma Agrária?
De uma forma muito simplista podemos dizer que pretende designar modificações directas na estrutura agrária de uma determinada zona ou País.
Que conta com a repartição ou da propriedade ou até mesmo do rendimento Sócio-agrário.
A reforma agrária é uma intervenção que pode ter dois caracteres diferentes o Revolucionário e o estritamente legalista, que ao contrario do revolucionário é feito de uma forma ordeira e até pacifica.
Estes dois processos recorrem de formas diferentes mas para atingirem o mesmo objectivo: Modificar a repartição da propriedade de forma a suprimir a propriedade privada ou vice-versa, por outro lado pretende ainda modificar o regime de inquilinato rural de modo a reduzir os encargos dos rendeiros e seus parceiros.
Mas neste trabalho vamos só tratar do primeiro processo a reforma agrária por via revolucionaria visando dar a conhecer os laços de dependências das classes economicamente inferiores da sociedade rural em relação aos grupos superiores.
A reforma agrária intentam a anular ou reduzir os privilégios existentes em proveito das categorias mais débeis da população.

As Reformas agrárias: sua classificação
As reformas agrárias podem classificar-se tendo em conta os objectivos específicos em vista: Visam a repartição rústica de maneira a tornar mais igualitário a divisão da terra agrícola ou florestal, por outro lado visa a redistribuir não a terra mas o rendimento da mesma.
No primeiro caso corresponde à remodelação da estrutura agrária mediante a divisão das áreas de certos limites e constituições à custa de novas zonas de média ou pequena e assim dota-lás de condições a manutenção do agregado familiar.
No segundo caso não pretende criar novos proprietários mas alterar a distribuição do rendimento da terra. O que acontece por duas formas:
1ª - A colectividade chama a si a propriedade da terra com ou sem indemnização dos antigos proprietários promovendo a repartição do produto por intermédio de empresas cooperativas.
2º - Não atinge o regime vigente da propriedade na sua essência nem afecta basilarmente a orgânica e o funcionamento dos vários tipos de empresas mas impõe modificações às relações económicas que vigoram entre os factores de produção através de leis a favor desta ou daquela classe, que alteram assim a fórmula de repartição do rendimento social-agricola.

A reforma agrária em Portugal
Mesmo com uma enorme necessidade de enfrentar a crise da agricultura portuguesa transformando as estruturas agrárias existente só com o 25 de Abril de 1974 e apenas no sul do País houve uma reforma agrária na Chamada ZIRA – Zona de Intervenção da Reforma Agrária tendo os como principais distritos:
Beja, Évora, Portalegre e Setúbal ainda parte dos distritos de Castelo Branco e de Santarém dois concelhos do distrito de Lisboa e as algumas freguesias de Faro limítrofes do distrito de Beja, tudo somado correspondia a 41% da superfície total do Continente que é caracterizado pela sua homogeneidade económica, social e ecológica.
Com a revolução de Abril a luta contra o regime capitalista latifundiário daí decorrente. E com esta luta existe uma combinação de recursos para assegurar o desbravamento do cultivo das terras de pior qualidade com a agricultura por conta própria nos solos de qualidade através da força de trabalho paga a jorna que constituía o típico latifúndio que se queria acabar.
Mas devido aos avanços e recuos da ocupação de terras foi sendo invertido as transferências do poder politico dos que promoveram a Revolução dos Cravos para os que foram depois democraticamente eleitos levando a devolução dos terrenos expropriados ao seus antigos donos, pois aconteceu que os trabalhadores provaram ser incapazes quer produzir bens satisfatórios de competição nos mercados e com isto veio pôr em causa muitas das modificações ocorridas no PREC.
Contudo até hoje algo fico da reforma agrária em Portugal desta reivindicação, desta luta, desta acção que mais se reflectiu no Alentejo.
Fico para a nossa história e para a nossa cultura expressões riquíssimas de força revolucionária tais como:
“Avante com a Reforma Agrária”, “ A terra a quem a trabalha”, “trabalho dá pão, repressão não” entre muitas outras que ficaram como bandeiras da evocação do trabalho popular e da defesa dos direitos dos trabalhadores e da sua acção reivindicativa que nada mais que isto deixou de ser uma acção reivindicativa.



Henrique Tigo

terça-feira, junho 14, 2005

Álvaro Cunhal




No dia em que conheci Álvaro Cunhal



Quando tinha 16 anos entrei para a Juventude Socialista pela mão do então secretário-geral Eng.º António Guterres e pelo fundador do PS Dr. Raul Rego. Contudo, tinha e ainda hoje tenho vários amigos do Partido Comunista Português, entre os quais na estava na altura a minha primeira namorada a Rita. Um dia tentou convencer-me a ir a um almoço do PCP, na Amadora. Já não me lembro bem porque razão era esse almoço, mas lembro-me de lá estar e ver entrar o Álvaro Cunhal acompanhado por várias pessoas. De seguida fez um daqueles seus típicos discursos ao que se seguiu o tal almoço.
Lembro-me que havia uma mesa central onde ficou sentado o Álvaro Cunhal e a sua comitiva. Sentaram-se e foram servidos, enquanto nós o “povo” tinha de ir para uma fila para buscar a sua comida. Passado algum tempo que estar na fila, fiz um comentário do género:
- Afinal onde está a democracia disto? Enquanto uns comem os outros estão aqui nesta enorme fila e ainda por cima cheio de sede…
Lembro-me que estava quase encostado àquela mesa presidencial, onde estava o Álvaro Cunhal, e que logo após este meu comentário ouvi uma voz masculina a dizer:
- Oh! Camarada, que não seja por isso, beba aqui um copo connosco!
Olhei e vi uma pessoa que estava sentada ao pé do Álvaro Cunhal mas de quem já não me lembro de quem seria e respondi:
- Eu até bebia, pois estou cheio de sede, contudo não bebo vinho…
Então o Álvaro Cunhal riu-se e disse-me:
Então bebe do meu copo que é o único desta mesa que tem água!
Após isto convidou-me para me sentar ao pé dele. Não aceitei, pois não queria abandonar a minha namorada e os amigos que tinham ido connosco, mas bebi a água do mesmo copo que o Álvaro Cunhal.
Agradeci e continuei na fila para ir buscar a minha comida. Depois sentei-me e comi. Quando estava a acabar a refeição senti uma palmadinha nas costas. Era o Álvaro Cunhal.
Trazia na mão dois livros de capa vermelha e disse-me:
- Ainda bem que ainda existem jovens que refilam e gostei de te conhecer. Olha estes livros são para ti…
Levantei-me e deu-me os livros. Apertou-me a mão e depois de perguntar o meu nome, foi-se embora.
É uma história que me lembro com alguma regularidade e hoje, que este homem desapareceu achei por bem contá-la. Ainda hoje tenho os dois livros que contam a história do Partido Comunista Português.
Não sou comunista, mas admiro muito aquele homem que foi um anti-fascista, um verdadeiro político, escritor e pintor.
É pena, que estes grandes vultos, estejam a desaparecer. Portugal está cada vez mais pobre…

In: Comarca de Arganil Junho de 2005