domingo, novembro 28, 2004

Fernando Valle


Tive a sorte e o privilégio de o conhecer pessoalmente, em casa de um amigo comum, o Professor Carlos Carranca. Nem queria acreditar que estava na presença de um dos maiores vultos portugueses, eu, um jovem que toda a vida tinha ouvido falar naquela lenda viva, nos seus feitos humanos, sociais e políticos… Timidamente tentei falar com ele e a minha surpresa foi enorme, pois encontrei naquele monumento vivo, um poço de simpatia com um discurso lúcido, num timbre de voz vigoroso, sem pausas nem cansaço.
Sentado ao seu lado, bebi todas as suas palavras sábias. Ele queria saber coisas da minha geração, perguntou-me a minha opinião e eu, lá fui respondendo e dialogando com este mestre com mais de 100 anos de existência e sabedoria.
Tivemos uma agradável conversa de mais de uma hora, à qual se seguiu um jantar e um agradável serão com Fados de Coimbra, pelas inconfundíveis vozes do Prof. Carlos Carranca, Dr. Almeida Santos e do Dr. Luís Góis. Já passavam das duas da manhã e sentado à minha frente estava o Dr. Valle, sem mostrar quaisquer sinais de cansaço ou sono, ao passo que nós, os mais jovens, já sentíamos o peso das pálpebras. Ele não; ele queria conversar e partilhar as suas opiniões de uma maneira mais viva e jovem que alguns de nós.
Voltei a estar com o Dr. Fernando Valle e cada vez que o fiz aprendi a admirar mais aquele homem de grande valor. Não podia deixar sempre que passava por Coja de ver sua casa com admiração, pois sabia que alí vivia um homem eterno.
No dia da sua partida estava a almoçar com um grupo de poetas e antigos militares e quando alguém disse que o Fernando Valle tinha desaparecido fez-se um silêncio, os semblantes tornaram-se tristes, e senti um aperto no coração e uma dor na Alma, pois tinha desaparecido mais um dos meus ídolos…
 Médico de profissão e lutador pela liberdade por convicção, foi um dos 27 fundadores do Partido Socialista em 1973, na Alemanha.
Um Maçom que sempre lutou por ideais nobres e generosos.
A sua grande força e a sua nobreza de carácter, aliadas às suas qualidades humanas e ao seu sentido de serviço aos outros, sempre se sobrepuseram aos seus interesses individuais.
O Dr. Fernando Valle ajudou a transformar este nosso País, num Portugal Livre e Democrático. Exerceu a profissão como Médico Municipal e Delegado de Saúde, foi demitido pelo Prof. Oliveira Salazar, mas continuou a tratar os pobres durante anos a fio.
São poucos os Portugueses que terão consciência do muito que se deve ao Dr. Fernando Valle, do exemplo de vida admirável e da sua determinada acção cívica e política a que nunca renunciou, nem mesmo depois de ter completado 100 ano. Depois da revolução dos cravos, recebeu inúmeras e merecidas honras, entre as quais a de presidente honorário do PS. Fernando Valle, nem o tempo nem os maus anos o conseguiram afastar da política e da causa humanitária que sempre seguiu.
Vai para sempre ficar gravada na minha memória aquela primeira vez que o conheci.
Dr. Fernando Valle, obrigado por tudo que fez por Portugal e por tudo que nos ensinou ao longo destes anos.
Um tríplice abraço fraterno, até sempre…

sexta-feira, novembro 05, 2004

Censura

Censura... de Ontem e de Hoje



A palavra censura é, por motivos históricos, de todos conhecida e, quando se fala nela não podemos deixar de sentir toda a sua imensa carga negativa. A censura foi desde sempre utilizada em todos os regimes ditatoriais, de esquerda ou de direita, e como Lenine disse: “A Liberdade de expressão é o bem mais precioso da humanidade, e por esse motivo há que ser racionada.”

Em todo o mundo e em pleno século XXI existem muitos lugares onde ela ainda vive e cada vez com mais força.

Em Portugal ninguém se esquece que existiu censura durante 48 anos com o Estado Novo ou regime Salazarista-Marcelista, e que os seus maiores impulsionadores eram os membros da PIDE - Polícia Internacional e de Defesa do Estado. A PIDE foi criada em 1945, pelo Decreto-Lei nº 35 046, de 22 de Outubro, e nos termos do preâmbulo deste diploma, a PIDE é concebida como "organismo autónomo da Polícia Judiciária", invocando-se para o efeito o modelo da Scotland Yard.

Colocada na dependência do Ministério do Interior, a PIDE dispunha de competência para proceder à instrução preparatória dos processos respeitantes a crimes contra a segurança do Estado para sugerir a aplicação das medidas de segurança e, enfim, para a definição do regime de prisão preventiva e liberdade provisória dos arguidos. Também lhe foi dada a faculdade de poder exercer censura sobre assuntos que “lesassem” o Estado.

Mas com a chegada do 25 de Abril de 1974 desapareceu a censura de Direita e acaba por nascer outra, desta vez de esquerda, exercida COPCON, mas durou pouco tempo.

Passados trinta anos do 25 de Abril de 1974 há quem acredite que a censura deveria existir, porque sem ela a sociedade e o povo não se educa.

Para essas pessoas há que censurar, programas de televisão, artigos de jornais e revistas, além de muitas outras coisas, alegando que temos de pensar nas famílias portuguesas. Não chega já não se estudar nas Escolas o que foi o Estado Novo e a PIDE?

Será que é melhor vivermos no país do faz de conta.? Fazer de conta que tudo é cor-de-rosa? Fazer de conta que os professores têm empregos? Fazer de conta que há educação para todos? Fazer de conta que temos direito à saúde e que as finanças e a economia estão boas? Fazer de contra que a gasolina e os transportes não estão caríssimos? Fazer de conta que este governo governa?... fazer de conta que faz de conta!

Há anos que vejo nos canais de televisão filmes a serem cortados. Não será isto uma forma de censura?

Durante anos fomos levados a crer que filmes de teor erótico ou pornográfico faziam mal. Ainda há pouco tempo foi censurado um canal privado “pago” que passava filmes pornográficos depois da meia-noite em nome da defesa das crianças. Curiosamente após o bloqueamento desse canal os crimes sexuais aumentaram. Não estaríamos melhor sem censura e deitando as crianças mais cedo na cama?

Os nossos pais e avós lutaram durante anos e anos para termos "liberdade de expressão"! Para quê? Para um governante que não foi eleito democraticamente queira recriar a Censura? Não Obrigado!

Ora, a liberdade de expressão é tão necessária como o ar que respiramos e a água que bebemos. Ninguém pode acabar com esse direito.

Devemos proteger os nossos direitos e protegermo-nos a nós mesmos. Temos de lutar e não ficar em silêncio.
Liberdade!
Sempre!

Henrique Tigo